Após as mudanças aprovadas no começo de abril que apertaram as regras do Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (Proagro), e que desagradaram a parte dos agricultores, o governo mira agora um novo alvo: o fato de as instituições financeiras acumularem a função de concessão do crédito ao produtor e de análise do pagamento do seguro em caso de sinistro. A avaliação - aceita pelo próprio setor - é de que isso representa uma relação conflituosa.
O Proagro é usado para socorrer pequenos e médios produtores em caso de eventos climáticos extremos, pragas ou doenças e, nessas hipóteses, o beneficiário fica isento de pagar os financiamentos contratados com bancos ou cooperativas, e o custo é assumido pela União.
Nos últimos anos, porém, o orçamento do programa quase quintuplicou em meio a suspeitas de fraudes, alertas sobre condutas negligentes de produtores e ações vistas como pouco rigorosas por parte de instituições financeiras e peritos.
Relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), de 2023, chamou a atenção para essa questão.
“O valor da indenização será calculado com base nas perdas amparadas e comprovadas pelo perito, que deve fazer uma avaliação técnica e independente; mas, no atual desenho da política, estas características podem restar comprometidas”, diz o documento, que ainda está em fase de análise na Corte de Contas.
“Quanto menos rigoroso for o perito em sua avaliação, menos riscos para quem concede o crédito rural”, destaca o TCU, que recomenda uma alteração normativa para que a comprovação das perdas não seja mais de responsabilidade dos bancos.
Diante do alerta, a equipe econômica estuda formas de substituir, ou ao menos supervisionar, a função de perícia exercida pelos bancos, a fim de evitar esse conflito.
A mudança deve exigir a aprovação de lei no Congresso Nacional, apesar de membros da Fazenda avaliarem que isso poderia ser feito diretamente pelo Banco Central (BC), que é o gestor do Proagro.
Além disso, seria necessário criar uma alternativa operacional, ou seja, uma forma de viabilizar a realização das perícias ou a sua supervisão nos milhares de municípios do País - são mais de 200 mil operações amparadas pelo programa.
OPÇÕES
Uma das opções é a criação de uma estrutura no Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) para receber e avaliar os laudos e demandas de cobertura do Proagro.
Para integrantes da equipe econômica, mesmo que haja avanço no uso de imagem de satélite para comprovação de perdas, o que ajuda a reduzir fraudes, o monitoramento remoto não elimina no curto prazo o papel dos peritos e dos bancos.
Integrantes do setor financeiro reconhecem que as mudanças poderiam levar a uma diminuição do conflito de interesses, mas dizem que a proposta precisa ser bem fundamentada e discutida conjuntamente com bancos e cooperativas.
Além disso, apontam preocupação com a parte operacional, ou seja, que as alterações ampliem o tempo de análise e concessão das indenizações - o que, na visão do setor, traria mais problemas do que soluções.
Interlocutores do MDA dizem que um decreto de 2023 já permite a supervisão dos peritos e prevê, inclusive, a criação de uma área para coordenar esse trabalho.
Mas, nesse caso, a comprovação das perdas continuaria sob responsabilidade dos bancos, cabendo ao MDA apenas acompanhar as autorizações do seguro.
REAÇÃO EM MS
Com a redução do teto custeado pelo governo de R$335 mil para R$270 mil e o valor anual de garantia de renda mínima, que passou de R$ 22 mil para R$ 9 mil, os representantes e especialistas temem que o pagamento de financiamentos rurais fiquem comprometidos.
“O custeio agrícola em lavouras que foram prejudicadas por eventos climáticos ou pragas e doenças, como vem ocorrendo com frequência são os que mais podem ser prejudicados”, avalia o analista de economia da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), Jean Américo.
Segundo o especialista as condições climáticas adversas cada vez mais frequentes no meio rural, inclusive vivenciadas de forma intensa no ciclo atual da cultura de soja e ainda a segunda safra são fatores que evidencial a necessidade da intensificação do programa.
“É uma medida fundamental para proteger a produção no campo, principalmente para os pequenos produtores”, aponta Américo.
Por outro lado o economista do Sindicato Rural de Campo Grande, Rochedo e Corguinho, Staney Barbosa Melo, aponta aspectos positivos das alterações realizadas no Proagro.
“A questão da simplificação do processo de comprovação dos gastos para o recebimento do seguro, por exemplo, é um ponto que tem mérito”, destaca.
R$ 270 MIL POR ANO
A principal mudança no Proagro foi a redução do limite de enquadramento, com redução de R$ 335 mil para R$ 270 mil por ano, além da queda do valor da indenização para 50% em zonas de maior risco.
Fonte: Correio do Estado